quarta-feira, 30 de julho de 2008

266. Submetendo-se todas as comunicações a rigoroso exame, sondando e analisando suas ideias e expressões, como se faz ao julgar uma obra literária e rejeitando sem hesitação tudo o que for contrário à lógica e ao bom senso, tudo o que desmente o carácter do Espírito que se pensa estar manifestando, consegue-se desencorajar os Espíritos mistificadores que acabam por se afastar, desde que se convençam de que não podem nos enganar. Repetimos que este é o único meio, mas é infalível porque não existe comunicação má que resista a uma crítica rigorosa.(6) Os Espíritos bons jamais se ofendem, pois eles mesmos nos aconselham a proceder assim e nada têm a temer do exame. Somente os maus se melindram e procuram dissuadir-nos, porque têm tudo a perder. E por essa mesma atitude provam o que são.
Eis o conselho dado por São Luís a respeito:
"Por mais legítima confiança que vos inspirem os Espíritos dirigentes de vossos trabalhos, há uma recomendação que nunca seria demais repetir e que deveis ter sempre em mente ao vos entregardes aos estudos: a de pesar e analisar, submetendo ao mais rigoroso controle da razão todas as comunicações que receberdes; a de não negligenciar, desde que algo vos pareça suspeito, duvidoso ou obscuro, de pedir as explicações necessárias para formar a vossa opinião."

267. Podemos resumir os meios de reconhecer a qualidade dos Espíritos nos seguintes princípios:


1º) Não há outro critério para se discernir o valor dos Espíritos senão o bom senso. Qualquer fórmula dada pelos próprios Espíritos, com esse fim, é absurda e não pode provir de Espíritos superiores.


2º) Julgamos os Espíritos pela sua linguagem e as suas acções. As acções dos Espíritos são os sentimentos que eles inspiram e os conselhos que dão.


3º) Admitido que os Espíritos bons só podem dizer e fazer o bem, tudo o que é mau não pode provir de um Espírito bom.


4º) A linguagem dos Espíritos superiores é sempre digna, elevada, nobre, sem qualquer mistura de trivialidade. Eles dizem tudo com simplicidade e modéstia, nunca se vangloriam, não fazem jamais exibição do seu saber nem de sua posição entre os demais. A linguagem dos Espíritos inferiores ou vulgares é sempre algum reflexo das paixões humanas. Toda expressão que revele baixeza, auto-suficiência, arrogância, fanfarronice, mordacidade é sinal característico de inferioridade. E de mistificação, se o Espírito se apresenta com um nome respeitável e venerado.


5º) Não devemos julgar os Espíritos pelo aspecto formal e a correcção do seu estilo, mas sondar-lhes o íntimo, analisar suas palavras, pesá-las friamente, maduramente e sem prevenção. Toda falta de lógica, de razão e de prudência não pode deixar dúvida quanto à sua origem, qualquer que seja o nome de que o Espírito se enfeite. (Ver nº 224.)


6º) A linguagem dos Espíritos elevados é sempre idêntica, se não quanto à forma, pelo menos quanto à substância. As ideias são as mesmas, sejam quais forem o tempo e o lugar. Podem ser mais ou menos desenvolvidas segundo as circunstâncias, as dificuldades ou a facilidade de se comunicar, mas não serão contraditórias. Se duas comunicações com o mesmo nome se contradizem, uma das duas é evidentemente apócrifa. A verdadeira será aquela em que nada desminta o carácter conhecido do personagem. Entre duas comunicações assinadas, por exemplo, por São Vicente de Paulo, uma pregando a união e a caridade e outra tendendo a semear a discórdia, não há pessoa sensata que possa enganar-se.


7º) Os Espíritos bons só dizem o que sabem, calando-se ou confessando a sua ignorância sobre o que não sabem. Os maus falam de tudo com segurança, sem se importar com a verdade. Toda heresia científica notória, todo princípio que choque o bom senso revela a fraude, se o Espírito se apresenta como esclarecido.


(6) "Não existe comunicação má que resista a uma crítica rigorosa". Esta confiança de Kardec na análise racional das comunicações é acertada, mas depende do critério seguro de quem analisa. Por isso mesmo é conveniente fazer a análise em conjunto e recorrer, no caso de dúvida, a outras pessoas de reconhecido bom senso. O Espírito farsante pode influir sobre um indivíduo e sobre o grupo, o que tem ocorrido com frequência em virtude da vaidade, da pretensão ou do misticismo dominante. Comunicações avulsas e até obras mediúnicas alentadas, evidentemente falsas, têm sido publicadas, aceitas e até mesmo defendidas por grupos e instituições diversas. (N. do T.)


8º) Os Espíritos levianos são ainda reconhecidos pela facilidade com que predizem o futuro e se referem com precisão a factos materiais que não podemos conhecer. Os Espíritos bons podem fazer-nos pressentir as coisas futuras, quando esse conhecimento for útil, mas jamais precisam as datas. Todo anúncio de acontecimento para uma época certa é indício de mistificação.(7)


9º) Os Espíritos superiores se exprimem de maneira simples, sem prolixidade. Seu estilo é conciso, sem excluir a poesia das ideias e das expressões, claro, inteligível a todos, não exigindo esforço para a compreensão. Eles possuem a arte de dizer muito em poucas palavras, porque cada palavra tem o seu justo emprego. Os Espíritos inferiores ou pseudo-sábios escondem sob frases empoladas o vazio das ideias. Sua linguagem é sempre pretensiosa, ridícula ou ainda obscura, a pretexto de parecer profunda.


10º) Os Espíritos bons jamais dão ordens: não querem impor-se, apenas aconselham e se não forem ouvidos se retiram. Os maus são autoritários, dão ordens, querem ser obedecidos e não se afastam facilmente. Todo Espírito que se impõe trai a sua condição. São exclusivistas e absolutos nas suas opiniões e pretendem possuir o privilégio da verdade. Exigem a crença cega e nunca apelam para a razão, pois sabem que a razão lhes tiraria a máscara.


11º) Os Espíritos bons não fazem lisonjas. Aprovam o bem que se faz, mas sempre de maneira prudente. Os maus exageram nos elogios, excitam o orgulho e a vaidade, embora pregando a humildade, e procuram exaltar a importância pessoal daqueles que desejam conquistar.


12º) Os Espíritos superiores mantêm-se, em todas as coisas, acima das puerilidades formais. Os Espíritos vulgares são os únicos que podem dar importância a detalhes mesquinhos, incompatíveis com as ideias verdadeiramente elevadas. Toda prescrição meticulosa é sinal certo de inferioridade e mistificação de parte de um Espírito que toma um nome pomposo.


13º) Devemos desconfiar dos nomes bizarros e ridículos usados por certos Espíritos que desejam impor-se à credulidade. Seria extremamente absurdo tomar esses nomes a sério.


14º) Devemos igualmente desconfiar dos Espíritos que se apresentam com muita facilidade usando nomes bastante venerados, e só com muita reserva aceitar o que dizem. Nesses casos, sobretudo, é que um controle severo se torna indispensável. Porque é frequentemente a máscara que usam para levar-nos a crer em pretensas relações íntimas com Espíritos excelsos. Dessa maneira eles lisonjeiam a vaidade do médium e se aproveitam dela para o induzirem a actos lamentáveis e ridículos.


15º) Os Espíritos bons são muito escrupulosos no tocante às providências que podem aconselhar. Em todos os casos têm apenas em vista um fim sério e eminentemente útil. Devemos pois encarar como suspeita todas aquelas que não tenham esse carácter ou sejam condenáveis pela razão, reflectindo maduramente antes de adoptá-las, pois do contrário nos exporemos a mistificações desagradáveis.


16º) Os Espíritos bons são também reconhecíveis pela sua prudente reserva no tocante às coisas que possam comprometer-nos. Repugna-lhes desvendar o mal. Os Espíritos levianos ou malfazejos gostam de expô-lo. Enquanto os bons procuram abrandar os erros e pregam a indulgência, os maus os exageram e sopram a discórdia por meio de pérfidas insinuações.


(7) As predições apocalípticas, com datas certas, de acontecimentos próximos têm sido feitas por espíritos pseudo-sábios nestes últimos anos. A linguagem dessas previsões seria suficiente para mostrar a falsidade das comunicações. Muitas outras ainda serão feitas, pois há sempre quem as aceite. O estudo atento deste resumo prevenirá as pessoas prudentes contra esses embustes, hoje tão numerosos e que pelo seu ridículo afastam muita gente das luzes da doutrina. (N. do T.)


17º) Os Espíritos bons só ensinam o bem. Toda máxima, todo conselho que não for estritamente conforme à mais pura caridade evangélica não pode provir de Espíritos bons.


18º) Os Espíritos bons só dão conselhos perfeitamente racionais. Toda recomendação que se afaste da linha recta do bom senso ou das leis imutáveis da Natureza acusa a presença de um Espírito estreito e portanto pouco digno de confiança.


19º) Os Espíritos maus ou simplesmente imperfeitos ainda se revelam por sinais materiais que a ninguém poderão enganar. A acção que exercem sobre o médium é às vezes violenta, provocando movimentos bruscos e sacudidos, uma agitação febril e convulsiva que contrasta com a calma e a suavidade dos Espíritos bons.


20º) Os Espíritos imperfeitos aproveitam-se frequentemente dos meios de comunicação de que dispõem para dar maus conselhos. Excitam a desconfiança e a animosidade entre os que lhes são antipáticos. Principalmente as pessoas que podem desmascarar a sua impostura são visadas pela sua maldade.


As criaturas fracas, impressionáveis, tornam-se alvo do seu esforço para levá-las ao mal. Usam sucessivamente os sofismas, os sarcasmos, as injúrias e até as provas materiais do seu poder oculto para melhor convencê-las, empenhando-se em desviá-las do caminho da verdade.


21º) Os Espíritos dos que tiveram, na Terra, uma preocupação exclusiva, material ou moral, se ainda não conseguiram libertar-se da influência da matéria continuam dominados pelas ideias terrenas. Carregam parte dos preconceitos, das predilecções e até mesmo das manias que tiveram aqui. Isso é fácil de se reconhecer pela sua linguagem.


22º) Os conhecimentos de que certos Espíritos muitas vezes se enfeitam, com uma espécie de ostentação, não são nenhum sinal de superioridade. A verdadeira pedra de toque para se verificar essa superioridade é a pureza inalterável dos sentimentos morais.


23º) Não basta interrogar um Espírito para se conhecer a verdade.
Devemos, antes de tudo, saber a quem nos dirigimos. Porque os Espíritos inferiores, pela sua própria ignorância, tratam com leviandade as mais sérias questões. Também não basta que um Espírito tenha sido na Terra um grande homem para possuir no mundo espírita a soberana ciência. Só a virtude pode, purificando-o, aproximá-lo de Deus e ampliar os seus conhecimentos.


24º) Os gracejos dos Espíritos superiores são muitas vezes subtis e picantes, mas nunca banais. Entre os Espíritos zombeteiros, mas que não são grosseiros, a sátira mordaz é feita quase sempre muito a propósito.


25º) Estudando-se com atenção o carácter dos Espíritos que se manifestam, sobretudo sob o aspecto moral, reconhece-se a sua condição e o grau de confiança que devem merecer. O bom senso não se enganará.


26º) Para julgar os Espíritos, como para julgar os homens, é necessário antes saber julgar-se a si mesmo. Há infelizmente gente que toma a sua própria opinião por medida exclusiva do bem e do mal, do verdadeiro e do falso. Tudo o que contradiz a sua maneira de ver, as ideias, o sistema que inventaram ou adoptaram é mau aos seus olhos. Falta a essas criaturas, evidentemente, a primeira condição para a recta apreciação: a rectidão do juízo. Mas elas nem percebem. Esse o defeito que mais enganos produz.(8)
Todas estas instruções decorrem da experiência e do ensino dos Espíritos. Completamo-las com as próprias respostas dadas por eles a respeito dos pontos mais importantes.(9)


(8) A afirmação de Kardec no nº 25: "O bom senso não se enganará" se refere, como vemos, às pessoas dotadas de bom senso. Neste nº 26 ele nos adverte quanto ao perigo das pessoas que não possuem "a rectidão do juízo". Por isso devemos recorrer com humildade ao juízo dos outros, não nos fechando orgulhosamente em nossas opiniões. (N. do T.)


(9) O próprio Kardec nos dá o exemplo do que ensina: completa as suas instruções com as respostas textuais dos Espíritos às suas consultas. Este é um exemplo vivo de como foi escrita a Codificação. Às suas experiências pessoais, aos resultados sensatos de suas observações, Kardec junta a opinião esclarecida dos Espíritos superiores. (N. do T.)


268. Perguntas sobre a natureza e a identidade dos Espíritos:


1. Por qual sinais podemos reconhecer a superioridade ou a inferioridade dos Espíritos?
— Pela sua linguagem, como distingues um estouvado de um homem sensato. Já dissemos que os Espíritos superiores nunca se contradizem e só tratam de boas coisas. Só querem o bem. Essa é a sua preocupação.
— Os Espíritos inferiores estão dominados pelas ideias materiais. Suas manifestações se ressentem da sua ignorância e da sua imperfeição. Só aos Espíritos superiores é dado conhecer todas as coisas e julgá-las sem paixão.


2. O conhecimento científico de um Espírito é sempre uma prova da sua elevação?
— Não, porque se ainda estiver sob a influência da matéria pode ter os vossos vícios e preconceitos. Há pessoas que são no vosso mundo excessivamente invejosas e orgulhosas. Pensas que ao deixá-lo perdem esses defeitos? Resta-lhes, depois que partem daí, principalmente as que alimentaram fortes paixões, uma espécie de atmosfera que as envolve e conserva todas essas coisas más.
— Esses Espíritos semi-imperfeitos são mais temíveis que os Espíritos maus, porque, na sua maioria, juntam a astúcia e o orgulho à inteligência. Pelo seu pretenso saber eles se impõem às pessoas simples e ignorantes, que aceitam sem exame as suas teorias absurdas e mentirosas. Embora essas teorias não possam prevalecer contra a verdade, não deixam de produzir um mal momentâneo porque entravam a marcha do Espiritismo e porque os médiuns se enganam ingenuamente quanto ao mérito das comunicações que recebem. Este o ponto que requer grande estudo de parte dos espíritas esclarecidos e dos médiuns. Para distinguir o verdadeiro do falso é que devemos convergir toda a nossa atenção.(10)


3. Muitos Espíritos protectores se apresentam com nomes de santos ou de personagens conhecidos. O que devemos pensar disso?
— Todos os nomes de santos e de personagens conhecidos não bastariam para designar o protector de cada criatura. São poucos os Espíritos de nomes conhecidos na Terra. É por isso que quase sempre não dão os seus nomes. Mas na maioria das vezes quereis um nome. Então, para vos satisfazer eles usam o de um homem que conheceis e que respeitais.


4. Esse empréstimo de nome não pode ser considerado uma fraude?
— Seria fraude se feito por um Espírito mau que desejasse enganar. Mas sendo para o bem, Deus permite que se faça entre os Espíritos da mesma ordem, pois entre eles existe solidariedade e similitude de pensamentos.


(10) Muitos entendem que não devemos importar-nos com as mistificações, pois a verdade acaba prevalecendo. Kardec toca o nó da questão ao advertir que estes embustes "entravam a marcha do Espiritismo" e prejudicam a actividade dos médiuns, perturbando-lhes o discernimento necessário ao cumprimento de suas missões. Grande número de criaturas sofrem a desorientação proveniente das confusões semeadas no campo doutrinário e muitas chegam mesmo a perder oportunidades de uma encarnação ardentemente solicitada na vida espiritual. Dever dos espíritas, portanto, é combater as mistificações e desmascarar os Espíritos embusteiros, assegurando o progresso normal da doutrina que eles se empenham em ridicularizar com suas teorias absurdas. Esse é o bom combate de que falava o apóstolo Paulo, em que os inimigos não são os Espíritos nem as pessoas por eles fascinadas, todos dignos do nosso amor, mas os erros semeados entre as criaturas ingénuas. (N. do T.)


5. Assim, quando um Espírito protector se apresenta como São Paulo, por exemplo, não é certo que seja o Espírito ou a alma do apóstolo desse nome?
— De maneira alguma, pois encontram-se milhares de pessoas às quais disseram que têm São Paulo como anjo guardião, ou outro santo. Mas que importa, se o Espírito que vos protege é da mesma elevação do apóstolo Paulo? Já vos disse: precisais de um nome e eles se servem de um para que os chameis e os reconheçais. É como fazeis com os nomes de baptismo para vos distinguir dos demais membros da família. Eles podem também tomar os nomes dos arcanjos Rafael, Miguel, etc., sem que isso traga consequências.
— Aliás, quanto mais um Espírito é elevado, mais se multiplica o seu poder de irradiação. Sabei que um Espírito protector de ordem superior pode tutelar centenas de encarnados. Entre vós, na Terra, tendes os notários que se encarregam dos negócios de cem ou duzentas famílias. Porque haveríamos de ser menos aptos, espiritualmente falando, na direcção moral dos homens, do que aqueles na direcção material de seus interesses?

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